Ancorar o Amor
Joaquim Santos
Apresentação - Instituto Politécnico de Leiria
29 de Outubro 2010
Este livro de Joaquim Santos é como uma viagem, quase uma demanda, num mundo cada vez mais materialista e individualista.
Quando penso neste livro em termos alegóricos, vejo um navio sulcando mares conturbados em busca de uma ilha paradisíaca, difícil de alcançar, mas que todos sabem estar situada no centro do universo. Nessa ilha habita um sentimento paradoxal e quase indefinível – o Amor.
O conceito gera, normalmente, debates conflituosos, posições antagónicas e, quiçá, sorrisos trocistas. É a razão dos séculos pós-iluministas sobre o romantismo das aventuras medievais. O racionalismo encarniçado contra o sentimento quase envergonhado.
No entanto, não estamos perante o conceito romanesco do termo, nem o autor se revê num cavaleiro andante, de armadura luzidia e espada em riste. Quando muito, vislumbro no papel de timoneiro um capitão de pele curtida e olhar perscrutante.
A ilha que procura é revestida de vegetação abrangente, rodeada de muitas baías e ancoradouros nos quais se recolhem, das tempestades exteriores, a Amizade, a Paz, a Autenticidade, a Verdade e o Sonho. Nem a Morte que atira para as areias, constantemente batidas pelas vagas alterosas, os despojos do mar – leia-se Vida – consegue impedir a continuidade do Amor, pois é ela que tudo coloca em perspectiva. É a escolha que cada naufrago faz dos escolhos trazidos pela maré baixa que irá condicionar toda a sua (sobre)vivência.
A viagem inicia-se por entre a bruma que envolve toda a qualquer demanda espiritual. Os contornos da ilha são obscuros e os picos das suas montanhas pouco perceptíveis à distância. O navio avança lentamente e ao leme o capitão firma as mãos.
O primeiro pico a ser avistado é o da montanha do Amor através dos tempos – um misto de paixão carnal e razões do espírito. É uma montanha envolta em lianas de sentidos e clareiras azuis de esperança.
No outro extremo da ilha, descobrimos um ancoradouro de uma praia de areia e pedra. Nas suas margens, ruínas de pedra de abrigos inacabados com tectos de relento e janelas abertas ao mundo.
Passado o recorte de um promontório, avistamos o pico da montanha do Amor à terra, na qual se ouvem os sussurros dos indígenas na brisa que sopra por entre as copas das árvores ancestrais. Nas conchas do mar, podem-se escutar lendas de tragédias e de naufrágios que despovoaram terras e mares e deixaram um povo à deriva.
O navio evita cuidadosamente os recifes de corais aguçados e prossegue viagem.
Em breve, se avista o pico mais alto: o da montanha do Amor a um Deus invisível mas benigno e misericordioso. É um pico grandioso feito para ser avistado bem ao longe, no coração de cada navegante. É uma “bússola do bem comum” que nos orienta nas tormentas.
Mesmo ao lado, temos o pico da montanha do Sonho, envolto em mistério e neblina. As suas baías são balsâmicas, providenciando descanso para as agruras da viagem e para as mãos calejadas do capitão do navio.
Eis que aqui chegado, o capitão-visionário lança âncora ao mar e prepara-se para explorar o interior da ilha.
Após o retempero do corpo, segue-se a (a)ventura de se entranhar na densa floresta em busca do seu cerne, da sua clareira centralizadora.
O comandante contista narra, em diário de bordo, as aventuras e desventuras inerentes ao desbravar selvas de palavras e encontrar um amor de carne e osso, com o qual compartilhar o resto dos seus dias. Após uma vida de naufrágios, dois seres afortunados, conseguem finalmente iniciar uma vida numa ilha paradisíaca, difícil de alcançar, mas que todos sabem estar situada no centro do universo.
A viagem, o navio e a ilha só valem a pena se o capitão souber retribuir, na medida certa, toda a aprendizagem na sua circum-navegação, desde o nascer até ao pôr-do-sol.
Gostaria determinar com a frase que considero a mais bela metáfora desta obra:
“Ele [o Amor] reside na madrugada dos dias, percorrendo todo o tempo até ao anoitecer.”
Ana Paula Mabrouk
27 de Outubro 2010
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