Foi naquele quarto velho –
Velho, não! – decadente
Que nos amámos muitas vezes.
Entrávamos em silêncio.
Tu desabotoavas-me a timidez
Eu desapertava-te a solidão.
Nas paredes bolorentas
Pendurávamos a tristeza
E na cama estreita deitávamos
Os corpos famintos.
Eu acolhia-te no meu abraço
Tu aconchegavas-me no teu peito
E ambos embalávamos vidas vazias.
Foi naquele quarto velho –
Velho, não! – miserável
Que vivemos nossas loucuras.
As palavras ficavam mudas
Perante a sofreguidão de uma fome
De muito tempo de ausências.
Minha mão na tua nuca alta
Tua mão no meu ventre desnudo
E no ar o cheiro a sexo premente.
Deixava no teu pescoço
Meus dentes marcados
Deixavas nos meios seios
Tua saliva máscula
E nossos corpos exibiam
Sinais de festim.
Como amava aquelas tardes ilegais
Escondidos do mundo
A descoberto de nós
Sem falsos pretextos
Nem moralismos vãos.
O meu corpo rejubilava de gozo
A magreza do teu transfigurava-se altiva
E o quarto agigantava-se.
Relembro odores, gritos, gemidos
Suspiros, rasgos de pele, vagidos
E a felicidade de um raio de sol
A pintar sorrisos nos sorrisos cansados.
Lembras-te daquela paixão muda?
Em que tudo calávamos
E tudo era dito em silêncio?
Gritado dentro de nós
E entendido sem sons?
Falamos tanto agora
E nada dizemos
Murchos vão os corpos
As almas secas
O quarto moderno clareou
O bolor habita agora os nossos corações.
20-11-2010
Ana Paula Mabrouk
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